29/05/2008

Conto de Natal - parte 4

Estava eu quase ao pé do bar do Chuva e a olhar para o sítio onde isto aconteceu, ao mesmo tempo que recordava a cena dos Poppers, quando dou de caras com um gajo giro a olhar para mim, com uns olhos que pareciam azeitonas. Reconheci imediatamente aquela cara!!! Era eu mais novo, e consequentemente, GIRO! FODA-SE, não só estava a recordar, mas também a presenciar a cena toda... Fiquei baralhado, chocado e desiludido! Afinal o matarroano era eu! Eu vi-me mais velho e não me reconheci!!! Eu vi o futuro naquele passado, aliás, eu vi uma espécie de fantasma e nem me apercebi... Quer dizer, apercebi-me que tinha visto qualquer coisa arraçado de humano, mas longe de pensar que era uma assombração. Passaram-me mil e uma coisas pela cabeça, inclusivé o facto de ter descoberto dois mistérios da ciência: o Deja Vu e a capacidade de ver o futuro, o que explica a razão dos rotos, os grandes consumidores de Poppers, andarem um bocadinho mais à frente em termos de moda. Mas aquilo arrasou-me porque cheguei à conclusão que estou um bocado velho e parecido com aqueles que eu anteriormente abominava. Fiquei ali especado, ignorando a batida sincopada a baixa frequência, uma coisa quase subsónica, que uns diziam que dava caganeira! Claro que esta tese foi tirada da cartola por um anarca flourescente das Goa Trance, e toda a gente sabe que esses indigentes se alimentam de cogumelos... Daí o fedor característico dessas festas! Só mesmo um gajo em constante alucinação para se divertir ao pé de chaparros e urtigas, próximo de uma aldeia no Alentejo sem água e luz...
Comecei a ter uma pequena ideia da razão daquilo tudo, de voltar ao passado, talvez fosse um aviso quanto à minha forma de pensar. Eu sabia que sempre tinha sido um filho da puta irrascível, pedante, arrogante e pouco me faltava para ser monárquico, mas tinha desculpa porque era jovem e rebelde. Agora que era mais velho, era mais moderado e até já começava a considerar que as gentes da margem sul eram de facto, gente! Mas continuava a ser o mesmo sectário, ainda renegava a Amadora e toda a linha de Sintra! Uma pessoa não muda de um dia para o outro, nem toda a gente é a Zita Seabra!
Galimedes, agarra-me no braço e diz-me:
-A nossa visita acaba aqui, agarra-te à pala e prepara-te que vamos embora!
-E vamos embora, assim? E não me dizes a razão disto tudo?
-Acho que já começas a perceber.
-Não me digas que também lês a mente...
-Não, mas até uma cabeleireira conseguia ler o que te ia na alma, por causa da cara que fizeste quando te estavas a ver mais novo.
-Mas não há mais nada que me queiras dizer?
-Há, mas digo-te depois! Após estes anos todos ainda não aprendeste que é impossível ter uma conversa num antro destes? Ou já não te lembras das canções do bandido abreviadas que cantavas a gritar aos ouvidos das matulonas, e mesmo assim, elas não entendiam metade?
-Sim, sim, sim... Estou a começar a ficar fodido porque hoje já dei razão vezes demais a um gebo com aspecto criminoso! Só o faço porque não és terreno, e mesmo assim... Não tarda estou a ficar comunista, a ter um estômago de ferro e começo por aí a fingir que dou razão aos pobres, oprimidos e desfavorecidos...
-Vá agarra-te à pala traseira do boné que nos vamos daqui!!!
E lá partimos nós a voar em direcção às luzes psicadélicas a alta velocidade e em segundos tudo se tornou nublado à minha volta. Passámos novamente pelos Geninhos a flashar no vazio e a gritar para o nada: "Os xeus doucumuentos e os da biatura, faxabôr!"
-Oh Ganimedes, as "ratazanas" estão aqui a fazer o quê?
-Eles estão na eternidade a repetir esta merda, até emagrecerem e ficar com um sotaque português. Acho que nenhum saiu daqui até agora...
-Porreiro, eu vou ficar uma eternidade na droga, no álcool, no pinanço e a fugir dos cobradores estatais e privados...
-Isso logo veremos, olha que ainda podes começar a levar uma verdadeira e subserviente vida de casado!
-Porra, não me rogues pragas. Olha que só casei porque há dias em que não tenho nem disposição nem sexappeal de engatar coirões devassos! E como sou bipolar, às vezes sinto-me deprimido e tenho uma panca por foder suburbanas como forma de auto-mutilação. Além disso é mais barato que uma mulher a dias e uma ida ao ginásio para treinar artes marciais! Quando acabei de dizer isto, já estava a entrar pela puta da janela de casa, todo nú. A porca ainda ressonava como uma pessoa, tal era o feitiço, acho mesmo que ela nem se mexeu durante a minha ausência. Um milagre, pois a puta a sopeira só era irrequieta quando ferrava no sono, porque quando lhe mandava para os fundilho, a gaja parecia uma estátua. Por algumas vezes ainda lhe tentei dar uns choques com o "TASER", mas a cabra conduz corrente e acabei por queimar a capeça do marsápio, o que me valeu uns dias sem foder em condições. Ganimedes, olha-me nos olhos e diz-me:
-A minha missão está cumprida. Agora vais adormecer, e mais tarde irás ser abordado por um outro camarada meu. Segue-o como seguiste a mim...
E desvaneceu-se ali mesmo, tipo aquela merda do "Star Trek" ou daquele programa reles da SIC, o "Ponto de Encontro". Era mesmo parecido, porque aquilo fez uns efeitos marados, tipo estrelinhas, e os que apareciam ou desapareciam tinham um aspecto do outro mundo ou de animais. Ou mesmo ambos, no caso do programa da SIC. A única coisa parva que não aconteceu, foi efeito sonoro! Foi silencioso! Quando me preparava para dormir é que me lembrei de um facto curioso, foi a primeira vez na vida que saí para a gandulagem e cheguei a casa sóbrio, pois esqueci-me de pedir ao Ganimedes uma gramita de coca DIVINAL. Mas também, aquilo não foi propriamente uma diversão.

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